Contra a postura do MEC em relação ao Fórum Nacional de Educação e as Conferências de Educação. Dirigimo-nos à sociedade brasileira para manifestar o que se segue. O conteúdo, também, já foi reportado ao Ministro da Educação, Mendonça Filho, por meio de ofício específico da Coordenação do FNE. Representa grave afronta à integridade do Plano Nacional de Educação (Lei nº 13005/14), à participação social e à realização das conferências de educação, todas conquistas da sociedade.
1. O Fórum Nacional de Educação (FNE), é um espaço de interlocução entre a sociedade civil e o governo, reivindicado pela CONAE, composto por 50 entidades, articulador das conferências nacionais de educação e uma das esferas legais de monitoramento e avaliação do Plano Nacional de Educação (PNE). A Lei nº 13.005/14, aprovada após amplo debate, assim demarcou o FNE e suas funções, no âmbito do MEC.
2. Vimos com muito empenho, seriedade e postura institucional, junto à gestão do MEC no último período, contextualizando e historiando, reiteradas vezes, o processo e as condições para o exercício da Coordenação e efetivo funcionamento do Fórum Nacional de Educação (FNE), seu lugar institucional, de Estado, e suas tarefas, especialmente no que concerne ao monitoramento e avaliação do PNE e em relação à realização da CONAE 2018. Passados 6 (seis) meses e sendo possível que fossem contornados quaisquer eventuais “passivos” anteriores e, também, feitas as avaliações e estudos próprios a uma gestão que assume, muito pouco foi efetivado pelo MEC no sentido de proporcionar ao FNE condições de funcionamento para cumprimento de suas determinações legais, o que deve ser, em absoluto, reconhecido e preservado pelo poder público. Importa realçar que a coordenação é exercida por uma representação da sociedade civil, expressão do amadurecimento, até então, do relacionamento entre diferentes campos que fazem a educação em nosso país.
3. Considerando a conjuntura do FNE no último período, tenho a obrigação de fazer os registros que se seguem, na expectativa de que o Ministro da Educação adote as providências necessárias para destravar questões administrativas e orientar seu Ministério no sentido de reconhecer o Fórum segundo a amplitude, legitimidade e envergadura que possui no debate e acompanhamento dos temas educacionais, em especial do PNE.
4. O Fórum Nacional de Educação não tem tido o devido respeito e reconhecimento por parte dos dirigentes atuais do Ministério da Educação. Ora silêncio, ora discricionariedade, ora protelação, ora arbitrariedade e pouca disposição ao diálogo para mediar encaminhamentos e decisões importantes que tocam o Fórum e a política educacional em nosso país. Exemplos importantes são as discussões em andamento sobre o Ensino Médio, a Base Nacional Comum Curricular, as discussões sobre as políticas de diversidade, a política de educação de jovens e adultos, o monitoramento dos planos de educação, o Sistema Nacional de Educação, o financiamento e o Custo Aluno Qualidade etc. Nas discussões relativas a tais matérias, entre outras, o MEC vem solenemente ignorando a discussão com o FNE e o próprio fórum.
5. Convém rememorar que, desde o afastamento da presidenta Dilma, inúmeras entidades foram recebidas ou acionadas pelo Ministro, o que não ocorreu inicialmente com o FNE: reuniu-se com a Confederação Nacional da Industria (CNI), o ator Alexandre Frota e integrantes do grupo Revoltados On Line, ACM Neto, deputados e políticos de partidos aliados, Fundação Lemann, TV Cultura, Secretário de Turismo de Pernambuco e outros dirigentes de seu Estado, Movimento Todos pela Educação, Representantes dos Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, Professores do Centro Lemann de Stanford, Sindicato dos Médicos de Pernambuco (SIMEPE), Mobilização Empresarial pela Inovação – MEI, Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), Confederação Israelita do Brasil (CONIB), entre outros. O FNE foi recebido somente após quase três meses de gestão e esgotadas inúmeras tratativas e agendas anteriores com a Sase, no limite, infrutíferas, já que os acordos feitos foram, posteriormente, reformados. Entre as situações de desprestígio e desrespeito ao FNE destacamos:
a) o não reconhecimento público do FNE, por parte do MEC, como órgão de Estado (previsto em Lei, decreto, portaria e regimento institucionais), à luz do afirmado pelo Ministro Mendonça, em reunião de 04 de agosto de 2016, oportunidade em que objetou tal condição do Fórum.
b) o agendamento de reuniões de trabalho entre setores do MEC e a coordenação do FNE com baixíssima resolubilidade, mesmo quando as demandas e encaminhamentos foram prévia e antecipadamente apresentados, sinalizando uma postura meramente protelatória por parte do Ministério.
c) a indefinição e desprezo acerca do lugar institucional para suporte ao FNE: em contatos prévios entre FNE e MEC, foi designada a Sase como focal para os assuntos do FNE; em agosto isso foi reafirmado pelo Ministro e, após, já em outubro, foi indicada a Secretaria Executiva Adjunta como ponto focal, mais uma expressão do desprestígio ao funcionamento regular do FNE, dadas indefinições. Percebe-se que, ainda hoje, o que toca ao FNE, em parte, é precariamente realizado na SEA e em parte na Sase, em uma situação esdrúxula e que gera muitas dificuldades.
d) a não definição de orçamento específico para a CONAE 2018, embora proposições tenham sida feitas e, ademais, a equipe do MEC possua ampla expertise no dimensionamento de eventos, de distintos portes, inclusive as conferências, já que realizou a CONEB 2008, a CONAE 2010, a CONAE 2014 entre outras atividades. Tal aspecto gera, ainda, dúvidas junto aos demais entes federativos que esperam a sinalização do orçamento que será destinado para se auto organizar e viabilizar sua contraparte (estima-se 50% do total necessário para cada esfera federativa).
e) o descumprimento dos prazos estabelecidos pelo Fórum em relação à realização da CONAE 2018 e seus desdobramentos, ao contrário do que garantiu o Ministro Mendonça no lançamento da CONAE em setembro, aspecto que enfatizamos a Vossa Excelência e especialmente solicitamos providências imediatas.
f) a negativa para utilização de espaços do MEC para a atividade do Seminário BNCC do FNE, conforme inicialmente acordado, até o mês de agosto, com sugestão despropositada de dirigente do MEC de que o mesmo fosse suportado pelas entidades da sociedade civil.
g) a não realização de Seminário Nacional sobre a BNCC, nos termos da metodologia e público propostos pelo FNE e acordados com MEC, mesmo após garantia de sua realização pela Sase.
h) o não cumprimento do compromisso em encaminhar, com antecedência ao FNE, a sistematização dos seminários estaduais sobre a BNCC para tratamento no seminário então acordado.
i) a não inclusão de notas públicas aprovadas no portal do FNE, mesmo com o compromisso de que seriam, aspecto que em muito prejudica o debate plural, a manifestações de posições legítimas e a divulgação das manifestações do Fórum à sociedade em geral. O portal está sem alimentação desde junho de 2016 (portanto há quase 6 meses), embora alternativas tenham sido indicadas em algumas oportunidades pela gestão do MEC, porém não autorizadas ou viabilizadas.
j) a não viabilização de uma assessoria de comunicação como historicamente disponível para o FNE, de nenhuma forma (consultoria, pessoal efetivo, estagiário etc) e em nenhum caráter (transitório ou temporário), o que representa grave cerceamento às condições de comunicabilidade do FNE.
k) a não inclusão nos portal do FNE e, mais grave ainda, a indisponibilidade de materiais gráficos da CONAE (com a marca do FNE, que é o articulador e coordenador das conferências) até o mês de dezembro corrente, mesmo após o lançamento da CONAE pelo Ministro, mais de três meses antes.
l) a não garantia de suporte técnico e administrativo adequado, via Secretaria Executiva do FNE, para garantir as atividades do FNE: redução drástica de pessoal, desmesurada e nada isonômica em relação às demais áreas do Ministério e do conjunto do governo e, conforme se pode perceber, com a ausência de quaisquer mediações. Vejamos:
i. negativas reiteradas para autorização de passagens para realização de missões por membros do FNE, compatíveis com as atribuições legais do FNE, a exemplo de: debates temáticos sobre tópicos de políticas públicas; atualizações e intercâmbios relativos à implementação dos planos de educação no país, monitoramento e avaliação; divulgação, planejamento, lançamento e articulações para a realização da CONAE 2018, bem como para o cumprimento de outras atribuições institucionais do FNE, nos termos da lei e dos regulamentos existentes;
ii. retirada de todos os cargos e funções técnicas, em grande medida, historicamente exercidas por (ou passíveis de exercício por) servidores concursados, antes à disposição da estrutura de apoio da secretaria executiva do FNE no MEC;
iii. eliminação da possibilidade de contratação de consultores temáticos, até o presente momento, inclusive com a finalização de projeto de cooperação internacional de suporte à mobilização social e ao FNE, que poderia ter sido prorrogado ou revisto pelo MEC, o que estava em andamento.
iv. diminuição em cerca de 4 vezes do volume de pessoal que já fora colocado à disposição do FNE.
v. demora, em mais de 5 (cinco) meses, para que fossem definidas, e ainda de forma absolutamente insatisfatória, as condições de trabalho da secretaria executiva do FNE e a condição do secretário executivo, servidor público concursado, que foi, inclusive, colocado à disposição do setor de pessoal durante o período, de forma desnecessária já que, inclusive, continuou sendo instado pela gestão a exercer atividades vinculadas de responsabilidade do MEC, mesmo sem estrutura mínima adequada (telefone, impressora, pessoal, orientações e autorizações etc). Antes disso, foram adotadas iniciativas para descaracterizar a secretaria executiva do FNE, espaço regimentalmente previsto e, ainda, para diminuição das funções do servidor público que, hoje, desempenha tais atividades, inclusive atribuindo-lhe funções e atividades que, avaliamos, não compatíveis com o cargo (trânsito de documentos, por exemplo ou subordinação a um setor estranho à sua lotação) e situações constrangedoras (como colocá-lo em uma sala somente após a acomodação das outras pessoas (que também não foram devidamente consultadas e esclarecidas sobre as dinâmicas de trabalho), sem quaisquer preparações, avisos prévios ou respeito institucional (considerando, inclusive que o atual secretário executivo é servidor concursado, foi assessor especial de ministro, secretário substituto da Sase e ocupou inúmeros cargos, sempre muito bem avaliado).
m) a não realização de quaisquer contatos ou tratativas a respeito do Custo Aluno Qualidade, mecanismos reivindicado pela sociedade e previsto na Lei do PNE. O MEC ignorou os comandos do PNE, as deliberações da CONAE e até as disposições de Portaria de sua lavra, a de nº 142 de 16 de março de 2016, que trata da Comissão Interinstitucional para Implementação do CAQi-CAQ, que nomina membros do FNE em sua composição. A instância possui atribuição legal no acompanhamento da metodologia.
n) o descumprimento de acordos no tocante à Base Nacional Comum Curricular, tema para o qual o FNE constituiu, com o apoio do MEC inclusive, um grupo de trabalho temporário, além de ser matéria a ser tratada no âmbito da instância de negociação federativa, prevista no PNE. Ao contrário, o MEC instituiu um Comitê Gestor da Base Nacional Comum e reforma do Ensino Médio, de caráter interno, ignorando o FNE e a instância de negociação federativa e seus papeis de acompanhamento e pactuação, além de não ter viabilizado a realização de Seminário Nacional sobre a BNCC, nos moldes propostos e inicialmente acordados, conforme já sinalizado acima.
o) a não consideração do MEC em relação à profunda divergência do FNE em relação à edição, por parte do governo, da Medida Provisória nº 746, da Reforma do Ensino Médio, desconsiderando a necessária ampla discussão prevista para o tratamento de todas as questões relativas à BNCC. Ademais, em reunião do FNE com a presença maciça dos representantes do MEC e da própria Secretária Executiva, em que já se observavam rumores da edição da MP, o MEC sequer mencionou a matéria e sua intenção de editar a MP, confirmada dias após.
p) vem protelado as medidas administrativas para viabilizar, em específico, as consultorias para elaboração do documento referência da CONAE, com perfis adequados e suficientes para tal desafio. Como sabemos, foram mobilizados, nas experiências anteriores de conferência, especialistas reconhecidos, respeitados competentes e independentes, em regra, oriundos de Universidades, para construção dos documentos da CONAE.
q) a não efetivação de qualquer interação ou convite por parte da Sase/MEC, junto ao FNE, tal como disposto na Portaria nº 619 de 24 de junho de 2015 (Instância Permanente de Negociação Federativa) ou nos termos do que dispões os projetos de lei relativos ao Sistema Nacional de Educação (do FNE e do MEC), para tratar dos temas de sua lavra, problema que se estende também a outras secretarias do MEC.
r) o congelamento das discussões sobre o Sistema Nacional de Educação, inclusive os processos de diálogo com o FNE e suas entidades que vinham sendo realizados. O prazo determinado pelo PNE foi solenemente descumprido.
s) a não realização de interação ou convite ao FNE para tratar e debater a respeito do monitoramento dos planos de educação e das políticas de valorização, por meio das redes próprias da Sase, tal como realizado em oportunidades anteriores
6. Ressaltamos, especialmente, que os procedimentos e o planejamento inicial relativos à CONAE 2018 estão à disposição do MEC e da sociedade há bastante tempo, sem que tenham sido oferecidas as condições mínimas para os desdobramentos necessários, pelo MEC, além da adoção de medidas mínimas sob sua alçada, o que é injustificável e inadmissível, dadas as disposições legais existentes. Caso o MEC mantenha a inoperância administrativa e continue a desmerecer o FNE, enorme prejuízo estará sendo gerado à integridade de um espaço de Estado, a uma lei fruto de intenso debate social e político, à realização dos processos de participação na educação e, em última análise, à própria política educacional do nosso país.
7. Reiteramos: as tarefas institucionais e legais do FNE não podem ser mais ou menos preservadas em função dos governos e suas orientações políticas distintas e, por isso, aguardamos pronta avaliação e acolhida ao arrazoado acima, pelo conjunto do MEC
8. Registramos que, até aqui, as tratativas com as Secretaria de Articulação com os Sistemas e a Executiva Adjunta estão longe do razoável.
9. Por fim reiteramos, sinteticamente, os nós críticos mais relevantes: o reconhecimento do FNE como espaço estratégico de debate, discussão e participação em relação à política educacional do país; a elaboração do documento referência da CONAE 2018; a definição da dotação orçamentária paras as etapas da CONAE 2018 e a construção de um entendimento sobre a realização das etapas municipais, estaduais e distrital envolvendo o MEC, os demais dirigentes de educação (UNDIME e CONSED) e de instituições federais de educação; e a garantia de melhores condições de funcionamento da secretaria executiva do FNE, todos aspectos que vem sendo insistentemente indicados pelo FNE, até aqui sem respostas existentes e consistentes.
Brasília 06 de dezembro de 2016.
HELENO ARAÚJO FILHO
Coordenador do Fórum Nacional de Educação